Japão supera 'Muralha da China' e volta a vencer nas Eliminatórias
Com texto de Tiago Bontempo, Futebol no Japão - GE.globo
Se na primeira rodada da fase final das Eliminatórias Asiáticas caiu o tabu do Japão nunca ter perdido para Omã, hoje manteve-se a escrita da China nunca ter vencido o Japão neste século. O placar foi magro e os Samurais Azuis fizeram apenas o suficiente para vencer pela vantagem mínima, graças de um gol de Osako pouco antes do intervalo, mas a seleção chinesa mostrou um futebol bem abaixo de Omã, apenas se defendendo no primeiro tempo e, quando tentou sair no segundo, praticamente não ameaçou, terminando com apenas duas finalizações e nenhuma na direção do gol.
A seleção chinesa, que perdeu para a Austrália por 3x0 na estreia e já ficou em situação delicada, trocou apenas três titulares hoje, mas a principal mudança foi tática. O técnico Li Tie abriu mão do 4-4-2 que vinha usando e, mesmo com pouco tempo de treino, adotou uma formação com cinco defensores, três volantes e apenas dois atacantes, a dupla Wu Lei e Ai Kesen (Elkeson). Apesar da saída de Zhang Linpeng, que se machucou logo no início, a muralha chinesa causou dificuldades ao ataque japonês, que pressionava, cercava, rodava a bola, colocava dez jogadores no campo de ataque e mesmo assim achava poucos espaços.
Kubo, atuando como um clássico camisa 10, e Furuhashi, pela ponta esquerda, eram os mais perigosos. Aos 38 minutos o Japão perdeu um gol inacreditável quando Kubo tabelou com Endo, Ito ficou de frente para o goleiro e passou para Osako, que chutou na trave com o gol vazio. Dois minutos depois, Ito disparou, ganhou na corrida de Wang Shenchao e cruzou para Osako, que se adiantou à marcação e escorou para as redes.
No segundo tempo, o Japão tirou o pé e jogou com certa cautela, deixando a China ter mais a bola. Li Tie logo voltou para sua formação padrão ao trocar o zagueiro Li Ang pelo meia Hao Junmin e colocar os brasileiros naturalizados A Lan (Alan) e Luo Guofu (Aloisio). Era um quarteto ofensivo com Ai Kesen e A Lan formando uma dupla na frente, Wu Lei pela direita e Luo Guofu pela esquerda, mas as limitações do time chinês ficaram evidentes e o goleiro japonês não precisou fazer nenhuma defesa até o apito final.
"Não tem jogo fácil na fase final das Eliminatórias", disse Osako. "Imagino que as próximas partidas serão bem complicadas", completou o atacante. O Japão, com três pontos, enfrenta no mês que vem as duas seleções que venceram os dois jogos até agora. No dia 7 de outubro, os Samurais vão até Jidá pegar a Arábia Saudita e no dia 12 jogam em Saitama contra a Austrália. Moriyasu, bastante criticado após a derrota para Omã, pode ficar em maus lençóis se não sair com pelo menos quatro pontos desses jogos.
Rivalidade centenária
Nesta sexta-feira, 10 de setembro, a Associação Japonesa de Futebol (JFA) completa 100 anos de fundação. Em homenagem a esse centenário, o uniforme do Japão este ano tem um patch com as datas "1921-2021". 100 anos atrás, a então República da China era a principal força do futebol asiático e foi a primeira rival da seleção japonesa. Naquela época, o Japão tinha a China como exemplo a ser seguido e a ser batido. O primeiro jogo da história da seleção japonesa foi contra essa República da China, derrota por 5x0 pelos Jogos do Extremo Oriente de 1917, quando o Japão era representado pelo time da Escola Normal de Tóquio (atual Universidade Tsukuba) e a China era representada pelo South China AA (time que existe até hoje na liga de Hong Kong). O Japão nunca derrotou a China no período pré-guerra, mas foi empatando com eles que conquistou o primeiro título (dividido) da sua história, nos Jogos do Extremo Oriente de 1930.
Em dezembro de 1980, aconteceu em Hong Kong o que era até hoje o único confronto da história dos dois países por Eliminatórias de Copa do Mundo. Um jogo que praticamente não teve repercussão no Japão na época. Não teve transmissão na tevê, apenas três torcedores japoneses estavam no estádio e só havia um fotógrafo como imprensa. Apesar de ter perdido por 1x0, esse jogo foi um ponto de virada na história do futebol japonês porque o Japão pela primeira vez em muito tempo "jogou melhor" que o adversário. Era o sinal de que o período de trevas e estagnação que foram os anos 1970 estava para acabar. Foi naquele jogo que despontou a geração liderada por Kazushi Kimura, o mestre das bolas paradas e grande craque japonês dos anos 1980.
Foi ali que o Japão começou a jogar com toque de bola e técnica, ao contrário da "correria" que marcou o período pós-guerra até ali. Uma geração que não conseguiu ir à Copa do Mundo (chegou perto em 1986), mas abriu caminho para a profissionalização e trouxe de volta o futebol baseado na escola escocesa que eles haviam aprendido nos anos 1920 com Kyaw Din, um intercambista da Birmânia (atual Mianmar), e tinha levado ao sucesso nas Olimpíadas de Berlim-1936. A partir dos anos 1980 o Japão resgatou seu estilo de jogo que foi perdido na guerra, com uma geração que cresceu maravilhada com o futebol brasileiro (a Copa de 1970 foi a primeira transmitida ao vivo na tevê japonesa), que passaria a ser a principal influência. E aquele jogo contra a China é considerado o marco que deu início a essa época.
Hoje os tempos são outros e a China é que tem o Japão como modelo a ser seguido e superado; tem investido bastante no futebol na última década, apesar de ainda não colher frutos com a seleção. O Japão manteve a escrita de não perder para a China no século e, desde a última derrota, em 1998, já soma sete vitórias e cinco empates nos últimos 12 confrontos.
A China entrou em campo bem recuada em uma formação 5-3-2, enquanto o Japão jogou no seu usual 4-2-3-1 — Foto: Futebol no Japão
Eliminatórias - China 0x1 Japão
Estádio Internacional Khalifa, Doha, Catar (sem público)
Gol: Yuya Osako (40')
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